As crianças e as emoções

As crianças e as emoções
Postado em: 09 de novembro Compartilhar Compartilhar

Autora: Rayssa Nassif - Psicóloga clínica e hospitalar CRP: 06/107.663

Todos nós já ouvimos aquele ditado popular: filhos não vêm com manual. Nos deparamos com filhos diferentes do que imaginamos, e desde recém-nascidos com suas características e singularidades. No entanto, a psicologia do desenvolvimento avançou muito nos últimos anos, trazendo evidências científicas quanto ao que se deve esperar de uma criança saudável, e formas de educar de maneira adequada.

Ao longo dos primeiros anos de vida as crianças adquirem habilidades sociais e emocionais, como se perceber como indivíduo, seguir instruções, se expressar, compartilhar com os demais, explorar seu ambiente e aprender com ele. Para bebês e crianças pequenas a previsibilidade de suas relações e do seu ambiente fortalecem sua base emocional. A partir de trocas afetivas com seus pais se sentem seguras para explorar e se desenvolver, e surgem diversas habilidades sociais e cognitivas, como aprender a brincar e a brincar com demais crianças, a ouvir, compreender e seguir instruções. ¹ ⁴

Em relação às emoções nos primeiros três anos de vida devemos lembrar que o cérebro da criança está em pleno desenvolvimento, porém ainda é considerado muito imaturo para realizar modulações. O choro é a primeira forma de expressão, e pode manifestar tantas coisas! Sua interpretação é uma das bases importantes para o desenvolvimento da linguagem. À medida que vai crescendo a criança ainda utiliza muito este recurso para manifestar incômodos ou frustrações, e devemos entender o que deseja ou mudar seu foco, mas evitar reprimir o choro. Desta forma estamos dizendo que suas queixas são ouvidas, oferecemos a modulação como exemplo através do acolhimento ou distração, e outros comportamentos importantes de exploração e de curiosidade da criança não são reprimidos ¹٠².

E quando pensamos em comportamentos desafiadores em crianças pequenas, já lembramos das famosas birras, assim como mordidas, tapas, entre outros . Neurologicamente, entre 1 e 3 anos de idade eles ainda não possuem vocabulário suficiente para se expressar nem recursos emocionais para lidar com frustrações. Seu cérebro entra em “pane”, e a criança faz movimentos corporais de descarga de energia - se joga no chão, chora, se recusa a colaborar. Os pais costumam se sentir envergonhados quando as crianças fazem as birras em público, mas lembre-se que é algo que acontece com todas as crianças e não indica que você é um cuidador ruim ou que não dá limites. Tais comportamentos tendem a passar na medida em que ela cresce e aprende a expressar seus desejos e necessidades, entre 3 a 4 anos ²,³.

Para lidar com as birras temos algumas dicas práticas ³:

●    Estar atento se a criança está com fome ou com sono,

●    Evite passeios longos em lojas (são hiper estimulantes) e envolva a criança na tarefa (exemplo: pegar algo e colocar no carrinho)

●    Se perceber que a birra está começando, tente distraí-la com algo que a interesse e demonstre muita atenção e interesse nisso

●    Comece a nomear seus sentimentos para ela desenvolver este vocabulário aos poucos (“você está frustrado porque não conseguiu brincar mais um pouco”).

●    Evite fazer as vontades da criança para que a birra passe, isso transmite a mensagem que ela consegue o que deseja desta forma

●    Não fale que é “coisa feia” ou que “não precisa chorar” - não ajuda a criança a se acalmar e com o tempo ela pode questionar se ela é amada ou atendida em suas necessidades.

●    Esteja atento se a criança pode estar precisando de tempo ou atenção direcionada e utilizando este recurso como forma de chamar sua atenção

●    Aceite que a raiva do seu filho é uma emoção que vai aparecer de vez em quando (acontece com todos nós, mas temos recursos para lidar com ela)

●    Procure manter a calma durante a birra, perder a paciência ou gritar não facilitam o processo. Assim que passar a criança vai voltar a ser colaborativa. Se você estiver no seu limite se afaste, se possível.

●    Perceba se a criança está chateada e deseja ser acolhida - se sim, a abrace e a tranquilize.

Para comportamentos como bater, morder, chutar lembre-se que muitas vezes a criança ainda não sabe que isso dói e incomoda o outro. Para ensinar que este comportamento não é aceitável não revide (bater, morder, puxar de volta) pois pode transmitir a mensagem errada que é aceitável. Diga que não pode fazer e a impeça antes (segurar a mão antes dela dar o tapa, por exemplo) ¹,³.

Outro ponto é que um comportamento agressivo pode ser uma resposta a um incômodo ou insegurança, então procure conversar com seu filho e veja se algo está o preocupando. Muitas vezes também é um pedido de atenção, então procure dar atenção e afeto em momentos que estiverem se comportando bem, as elogiando. Você pode notar que a criança precisa de um local ou gesto seguro para seu comportamento de descarga, então a leve para correr e gritar, ou ofereça almofadas para dar tapas. Isso funcionará melhor do que um não pode, e pode ser uma chance de também nomear os sentimentos quando os ânimos se acalmarem ³ .

As crianças precisam de outros seres humanos para mostrar o que é esperado delas e para se perceberem como um sujeito, e não apenas extensão dos seus pais. Comportamentos desafiadores exigem muito dos pais e cuidadores, mas podem funcionar como uma ponte para aquisições emocionais importantes.



 

Referências:

1- Establishing a Level Foundation for Life: Mental Health Begins in Early Childhood. National Scientific Council on the Developing Child, Center on the Developing Child at Harvard University, 2012.

2- Siegel, Daniel; Bryson, Tina Payne: O cérebro da criança - 12 estratégias revolucionárias para nutrir a mente em desenvolvimento do seu filho e ajudar sua família a prosperar. Dezembro, 2015

3-   https://www.nhs.uk/conditions/baby/babys-development/behaviour/temper-tantrums/

4 - https://www.ncsl.org/research/human-services/social-and-emotional-development-in-early-learning-settings.aspx

BR-18933. Material destinado a todos os públicos. Ago/2022

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